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Entrevista Rádio Livre Antena Negra para a Agência de Notícias Anarquistas

Posted: June 15th, 2010 | Author: | Filed under: Entrevistas | Comments Off on Entrevista Rádio Livre Antena Negra para a Agência de Notícias Anarquistas

A independência de uma rádio
ou qualquer veículo de informação está totalmente ligada a sua
capacidade de se auto-sustentar

[Uma das propostas da Rádio Antena
Negra é dar “
voz a um mundo onde caibam
muitas outras coisas, rico em cultura, informação e sabedoria”,
abrangendo música, notícias, manifestos e anarquia em geral. A emissora
funciona na região central de Porto Alegre (RS). Confira a entrevista
abaixo que eles e elas concederam à ANA.
]

Agência
de Notícias Anarquistas >
Conte um pouquinho da história da rádio
Antena Negra, como ela surgiu, em que contexto… Aliás, este é um
projeto anarquista?

Antena
Negra <
Este
é um projeto 100% libertário, levado a cabo por ativistas de diferentes
áreas, algunxs delxs com experiências prévias em rádio, que se reuniram
para desobedecer, resistir e insistir na idéia de formação de uma rede
de transmissão de rádio ampla capaz de fazer frente ao monopólio da
mídia corporativa. A rádio surge em um contexto pouco convencional,
tocada por ativistas cansadxs de terem a imagem de movimentos sociais e
dissidentes, jogada na lama pela mídia corporativa, mas também num
contexto de um estado repressor e reacionário que é o Rio Grande do Sul,
que não a toa foi o estado de origem de diversos ditadores do período
militar.

ANA
>
Mas em que ano ela surge?

Antena
<
A rádio
surge com esse nome em Julho de 2007, a partir de uma idéia antiga e
muita vontade, mas ainda haviam muitas lacunas e muito pouca gente para
pegar junto. Tivemos muitos problemas técnicos para resolver, isso
aliado a muita paranóia com a repressão resultou em grandes intervalos
de transmissão para reestruturação. Em alguns momentos pareceu mesmo que
ela nunca voltaria para o ar e que o projeto estava arruinado antes
mesmo de engrenar. Algunxs de nós ainda têm essa sensação de que estamos
antes de um início de fato, porque o que querem fazer é sempre algo
maior. Mas hoje festejamos o fato de estarmos no ar todos os dias da
semana, e novos grupos estão se juntando ao projeto, o que consideramos
muito bom por tornar possível dar visibilidade à diversidade inerente à
nossa proposta libertária, isso tudo em uma única iniciativa.

ANA
>
Esta é uma rádio tradicional, com freqüência, ou só funciona pela
internet?

Antena
<
A Antena
Negra é transmitida pela freqüência 92.5 FM para toda a região central
da cidade de Porto Alegre, e também pela internet para todo o mundo pelo
endereço http://giss.tv:8000/antena_negra.mp3.m3u.
Atualmente só transmitimos das 18h30 às 22h30 devido a questões
técnicas, e também pelo fato de optarmos por não repetir a programação.
Nosso objetivo é fechar uma grade de programação cada vez mais extensa,
através da parceria com coletivos e indivíduos de aspiração libertária. A
Antena Negra não é uma rádio tradicional porque seus conteúdos podem
ser produzidos e ir para o ar de qualquer lugar, sem a necessidade de um
estúdio central ou equipamentos sofisticados. Também não é uma rádio
tradicional na medida em que apostamos na transmissão via internet para
transmissores de FM que têm suas localizações mantidas em sigilo até
mesmo da maioria dxs comunicadorxs, sendo conhecidas apenas pelo
coletivo técnico. Isso é necessário porque grande parte das apreensões
da Anatel (
Agência
Nacional de Telecomunicações
) se dá a partir de denúncias que especificam o local da
transmissão. Esta é uma medida que busca também proteger os coletivos
que tocam os programas, assim estão apenas fazendo uma transmissão via
internet.

ANA
>
Então a rádio não funciona num lugar fixo?

Antena
<
Em parte
sim, em parte não. Somos muito adaptáveis. A captação pode se dar de
qualquer PC. Os programas podem ser ao vivo se estiverem conectados à
internet ou gravados e passados para algum outro comunicador que vai
fazer o streaming para o transmissor. Buscamos trabalhar com a
tecnologia disponível, a maioria dos programas é feita apenas com um
computador e um microfone simples, e ainda assim garantimos uma
qualidade muito próxima de uma rádio convencional, mostrando que não é
preciso de milhares de reais para se fazer um bom veículo de
comunicação.

ANA
>
E é uma rádio juridicamente legal, ou assumem o título de rádio
pirata?

Antena
<
É uma
rádio muito legal, nos divertimos bastante fazendo rádio. Mas é uma
rádio  juridicamente ilegal porque não somos amigxs de nenhum político
gordo e rico, nem temos lobbistas no senado para termos uma con$e$$ão.
Aliás, somos contra essa atitude de se arrastar atrás de con$e$$ões, até
porque isso soaria estranho vindo de uma rádio anti-estatal. Não
precisamos de nada que venha do estado para nos sentirmos legítimxs.
Ninguém tem o direito de nos governar. Quanto a assumir o título de
pirata, como não somos nós que estamos sempre atrás do ouro, esse título
não nos cabe. Estamos mais para uma rádio resistência, uma rádio
guerrilha, uma freqüência libertada, fazemos rádio como um exercício de
liberdade comunicativa. 

ANA
>
E como é a programação?

Antena
<
A
programação tenta abranger todas as pessoas e coletivxs envolvidxs na
construção da rádio, de forma horizontal e não burocrática. Cada um tem
seu espaço, e os horários e temáticas mais gerais são definidos em
reunião ou através de e-mail, telefone, etc. As pessoas que assumem a
tarefa de tocar um programa, individualmente ou em grupo, têm autonomia
sobre seus programas, e no fim das contas a programação vira um mosaico
fluído construído coletivamente por todas essas informações, opiniões e
sons. A rádio transmite diversos gêneros musicais, sempre misturados a
noticias, chamadas, relatos, opiniões e manifestos… dando voz a um
mundo onde caibam muitas outras coisas, rico em cultura, informação e
sabedoria; o que a mídia corporativa tanto abomina e culposamente
ignora!

ANA
>
Vocês já tiveram a experiência de transmitir um evento, como uma
manifestação, ao vivo?

Antena
<
Em agosto
do ano passado o programa Vozes da Rua fez a cobertura da 3ª Marcha
Lésbica de Porto Alegre. No final daquele mesmo ano, o programa o Centro
é do Povo reportou algumas manifestações dxs camelôs expulsxs do centro
de Porto Alegre por conta de um projeto higienista de revitalização que
está excluindo a população pobre da região central da cidade. Nenhuma
das coberturas se deu ao vivo, mas foram gravadas e veiculadas no mesmo
dia dos acontecimentos. Estamos planejando fazer a cobertura ao vivo da
Feira do Livro Anarquista que está sendo planejada para a cidade num
futuro próximo, mas ainda sem data definida.

ANA
>
E como vocês se viram com as questões dos custos?

Antena
<
Como todo
veículo de comunicação independente a grana é sempre um problema, mas
nos viramos fazendo festas, camisetas e angariando contribuições dxs
participantes do coletivo e colaboradores em geral. Esse processo apesar
de trabalhoso é fundamental para a construção de uma rádio realmente
livre. Algumas pessoas falam em apoio estatal para a construção de
mídias livres, mas não concordamos com essa visão, a independência de
uma rádio ou qualquer veículo de informação está totalmente ligada a sua
capacidade de se auto-sustentar.

ANA
>
O fator grana continua sendo a tarefa mais árdua para se manter
uma rádio no ar?

Antena
<
Apesar de
ser um fator problemático, a grana é mais um dos nossos problemas, mas
não a tarefa mais árdua. Com um coletivo amplo e disposto a ceder um
pouco de tempo para construir eventos e outras formas de captação de
recurso não é impossível de resolver. O fator de uma possibilidade de
repressão é talvez o que mais incomoda e ao mesmo tempo exige mais da
nossa criatividade. Ficar jogando xadrez com a Anatel é um verdadeiro pé
no saco. 

ANA
>
E já tiveram problemas com a repressão?

Antena
<
Mais ou
menos, nunca fomos pegxs, porque adotamos o ocultismo como estratégia
política. Mas já sofremos repressão por parte de rádios comerciais que
possuem freqüências próximas à nossa no dial: como têm equipamentos
muito mais potentes que os nossos (inclusive alguns especialistas dizem
que foram elas que derrubaram a estação Mir e o muro de Berlin), elas
ampliam sua potência para encobrir o nosso sinal. A Anatel está mais
presente em nossas mentes paranóicas do que como uma possibilidade de
repressão real, estamos alguns passos a frente delxs.

ANA
>
Há alguma rádio libertária que vocês têm como referência,
inspiração?

Antena
<
A antiga
Rádio Alice de Bolonha, sem dúvida é uma inspiração presente. A rádio
Muda é uma referência na nossa história, porque foi a partir da
generosidade delxs que pudemos contar com nosso primeiro transmissor
provisório. Várias rádios comunitárias e livres, como aqui em Porto
Alegre A Voz do Morro, do Morro Santana e da Rádio Quilombo da Restinga
são nossas parceiras cujo trabalho respeitamos e acompanhamos.

ANA
>
Qual a dica que vocês dão para quem deseja montar uma rádio neste
formato?

Antena
<

Organizem-se e busquem estabelecer parcerias com grupos que tenham o
mesmo comprometimento, uma rádio pode ser tocada de diversas formas, o
importante é encontrar formas de diminuir a tensão e se divertir
informando. Antes de comprar um equipamento, procurem conhecê-lo
suficientemente. Entrar em contato com pessoas que já tenham experiência
facilita nas questões de operacionalização e manutenção. Estar sempre
precavido e antecipar possíveis jogadas da repressão traz mais confiança
e diminui o nível de paranóia. Aceitar como parceiros grupos que não
estejam alinhados com idéias libertárias pode implicar em diversos
problemas: grupos políticos partidários de pseudo-esquerda podem tentar
roubar o seu equipamento, cuidado com elxs. Quando forem começar a
transmitir tenham certeza de que sua(s) antena(s) e transmissor(es)
estão em locais seguros e sigilosamente guardados, cuidem também para
que o campo eletro-magnético de sua transmissão não esteja interferindo
em outros sinais (como por exemplo de TV). Nunca caiam de um telhado e
se forem adeptos da ação direta radical, não deixem de derrubar algumas
das antenas de rádios comerciais.

ANA
>
Para finalizar, qual a opinião de vocês sobre as políticas de
“democratização dos meios de comunicação” do governo Lula, a Confecom,
inclusão digital…

Antena
<
Democracia
há muito tempo é um significante vazio que elites eleitorais manipulam
com a intenção de chegar ao poder. O Governo populista de Lula tem
muitas faces, uma delas acabou atraindo muita gente capaz, ao menos por
um tempo, que implementou projetos interessantes garantindo acesso à
tecnologia para alguns grupos populares. Mas ao mesmo tempo, em sua
outra face, esse mesmo governo reprimiu sem pudores muitas outras
iniciativas autônomas e populares de comunicação, principalmente aquelas
que não tinham rabo preso com ninguém. Por mais interessantes que
possam ser esses projetos no âmbito governamental, provavelmente não
irão sobreviver à alternância partidária do sistema político
representocrático. É triste ver projetos interessantes criados por gente
dedicada à transformação servindo na próxima campanha política do PT
para esconder a vergonhosa face da repressão. Se as contradições sociais
tendem a se agravar, o estado só pode assumir uma postura cada vez mais
autoritária e repressiva para garantir que o interesse das elites seja
respeitado e que a empobrecida ex-classe média fique em seu lugar de
urbanóide-espectador-eleitor-consumidor-de-porcarias.

ANA
>
Mais alguma coisa?

Antena
<
Um
"foda-se" especial para Hélio Costa (ex-ministro das Comunicações) e
José Artur Filardi (atual ministro das Comunicações), e nossas saudações
a todxs xs que lutam por um mundo sem ministrxs nem ministérios! Viva a
Anarquia que é Ordem anti-hierarquia contra a monotonia!


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